A escuridão havia caído como um véu espesso sobre os telhados da vila de Vallon. A neblina da noite, moldada pelas correntes de vento frio que sopravam do leste, envolvia as construções tomadas pelos saqueadores como um espectro silencioso. O luar, embora parcialmente oculto pelas nuvens, oferecia clarões esparsos, revelando por breves momentos os contornos retorcidos da ocupação: guardas cambaleantes, torres improvisadas, e o riso áspero de homens embriagados à beira de fogueiras.
No topo da colina, camuflados pelas sombras das árvores, Alastor e seu grupo observavam os últimos movimentos antes de dar início à operação. A respiração era contida. Os olhos, atentos. Cada um sabia exatamente o que fazer.
— Lembrem-se do plano. Rápidos, letais, silenciosos. Nós dividiremos a vila em três setores. Erina cuida do perímetro norte, Azriel cobre o leste com apoio de Sorya, e eu me encarrego do centro. — Alastor sussurrou, encarando os três.
— E o líder do bando? — indagou Erina, puxando a capa negra sobre os ombros.
— Segundo Rudin, ele é muito arrogante e está numa das casas principais no centro da vila. Não sairá tão cedo. Devemos focar em eliminar a maior parte dos saqueadores antes de confrontá-lo.
Sorya soltou um longo suspiro, quase musical.
— Eles são muitos… mas não disciplinados. Isso nos dá uma vantagem.
Alastor assentiu. Seus olhos percorreram os rostos dos companheiros, lealdade inabalável em cada um deles, e então puxou a Umbraeternal de sua bainha. A lâmina negra absorvia a luz ao redor, como se refletisse nada além de escuridão.
— Vamos mostrar a eles que a justiça ainda existe neste mundo.
O grupo desceu pelas sombras. Sorya envolveu Azriel em uma aura de camuflagem natural, folhas negras como cinzas flutuando ao redor dele enquanto Erina se esgueirava entre as casas como um vulto. Alastor, por sua vez, ativou a Dança das Sombras, fundindo-se ao breu noturno, movendo-se pelas vielas com precisão assassina.
O primeiro alvo caiu sem som.
Um dos vigias do setor norte, entorpecido pela bebida, sequer teve tempo de reagir quando a adaga curva de Erina perfurou sua garganta. No leste, Azriel conjurava com hesitação uma Lança Relampejante, acertando o peito de um inimigo antes que ele pudesse gritar. Sorya finalizava os caídos com vinhas espectrais que emergiam do solo e esmagavam as gargantas dos alvos.
Alastor atravessou dois guardas com sua lâmina como se fossem meras folhas de papel. A Explosão Sombria invocada logo em seguida apagou uma fogueira e incinerou três inimigos próximos em um clarão púrpura silencioso.
A vila estava em alvoroço, mas não totalmente desperta.
Por um breve momento, parecia que o plano de Alastor teria êxito total — até o grito estridente de um dos bandidos ecoar no centro da vila.
— ALAAAAARME!! ALGUÉM NOS ATACAAA!
Tudo desmoronou.
Rugidos e trombetas improvisadas começaram a soar, chamando os bandidos restantes à defesa. Alastor deu o sinal de recuo para Azriel e Sorya, mas já era tarde demais.
Do centro da vila, quatro figuras emergiram, rasgando a noite com suas presenças brutais.
O primeiro era um homem largo como um touro, vestindo uma armadura de placas velhas e com um machado de duas mãos manchado de sangue seco nas costas dando-lhe um ar muito ameaçador. A barba desgrenhada e o olhar predador deixavam claro que não era um adversário comum.
— Heh… então são esses os ratos que acham que podem nos caçar? Que ousadia. — sua voz era um trovão abafado.
Ao seu lado, um homem ágil e de sorriso sinistro girava duas adagas curvas, vestindo couro leve e adornado com colares feitos de pequenos ossos. Ele arqueava a sobrancelha, zombeteiro.
— Tsc, tsc… Vocês se acham espertos, matando os fracos primeiro? Onde está a honra no caos, hein? Que tipo de heróis vocês são?
Mais à direita, um terceiro homem avançava arrastando uma espada larga e dentada. O metal da lâmina parecia torto, cruel, e o braço que a empunhava era desproporcionalmente forte, coberto por tatuagens tribais.
E então, o quarto. Vestido com um manto vermelho escuro, olhos dourados e um bastão adornado por cristais flamejantes. Sua presença era a mais imponente. Os bandidos ao redor davam-lhe espaço naturalmente, como se fosse mais que um deles.
— Eu estou cansado de ser acordado, não dá para descansar à vontade aqui. Tsc. Sempre tem um dia em que os insetos decidem brincar de heróis. E então queimam. — disse o homem de manto vermelho que é claramente um mago, sua voz repleta de tédio e desprezo.
O calor aumentou no ar à medida que ele elevava o bastão lentamente.
Erina apareceu ao lado de Alastor, as mãos manchadas de sangue. Ela estreitou os olhos para os quatro.
— Eles são… diferentes. Esses quatro são de certeza mais experientes. Muito mais do que os outros.
— Generais. — murmurou Alastor. — Talvez subordinados diretos do líder.
Sorya e Azriel juntaram-se ao grupo segundos depois, ambos ofegantes após o caos que se instaurara nas ruas.
— O que fazemos? — perguntou Azriel, segurando a sua espada firmemente.
— Lutamos. Não temos escolha.
O primeiro a atacar foi o homem do machado. Num salto quase sobre-humano, ele caiu com a arma diretamente sobre Alastor. O impacto fez o chão tremer. Alastor bloqueou com dificuldade, sendo lançado alguns metros para trás mesmo com a ativação da Barreira das Sombras.
Erina desapareceu com um sopro e tentou uma abordagem furtiva contra o duelista das adagas. O homem, no entanto, bloqueou cada ataque com facilidade, rindo como se estivesse dançando.
— Uhh, que garota linda. Pena que vai morrer nas minhas mãos, né?
Erina rosnou. — Seu fôlego fede a carniça. Cala a boca.
Sorya invocou raízes demoníacas para deter o espadachim, mas ele avançava em linha reta, quebrando-as com força bruta. Cada golpe dele fazia o solo tremer, deixando estilhaços voarem em volta.
O mago, por sua vez, ergueu o bastão aos céus e conjurou uma Esfera Flamejante que se dividiu em quatro meteoros menores. Um deles atingiu a lateral da estalagem onde se escondiam alguns aldeões, apenas a barreira conjurada por Sorya impediu um massacre imediato.
— Esse mago é a nossa prioridade! — gritou Alastor.
Azriel recuou alguns metros, ativando Corrente Relampejante, lançando feixes de eletricidade na direção dele. O mago desviou com movimentos mínimos, murmurando algo em um idioma arcano.
— Interessante… esse aí tem talento. Será que ainda pulsa quando eu arrancar o coração? — O mago falou com um sorriso sarcástico e um olhar de desdém.
O caos havia tomado conta do campo de batalha. O plano inicial de Alastor havia falhado parcialmente devido à falta de informação suficiente sobre o inimigo e à força inesperada dos quatro generais. Agora, enfrentando inimigos perigosos em uma luta que exigiria cada grama de esforço e sinergia entre os membros do grupo, o desfecho da missão pendia no fio da espada e da vontade de sobreviver.
No alto de uma das casas principais, uma vela se apagava lentamente, enquanto dentro dela, o verdadeiro líder dos bandidos ainda se entregava ao vinho e aos prazeres, sem qualquer preocupação em relação ao barulho que vinha do campo de batalha, inconsciente de que seus pilares estão prestes a ruir.