O elevador subia devagar, como se o tempo estivesse conspirando para que cada segundo ali fosse eternizado.
A música instrumental ambiente não fazia sentido algum naquele momento, era abafada pelo som abafado da respiração de Victória, que estava encostada no peito de Kael, o braço dele repousando com naturalidade na cintura dela.
Ela estava quente.
Literalmente quente, e não só por conta do álcool ou da roupa justa.
Era o calor daquele instante.
Da adrenalina.
Da proximidade.
Kael, por outro lado, estava... quieto.
Mas não um silêncio indiferente.
Era um silêncio carregado.
Daquele tipo que grita.
Que segura tudo por dentro, enquanto o mundo parece desacelerar.
Quando as portas do elevador se abriram com um ding.
Victória não hesitou. Pegou a mão dele, puxando-o com firmeza pelos corredores até a entrada da sua suíte presidencial — onde uma única noite poderia custar o suficiente para comprar uma casa no interior.
Assim que a porta se fechou atrás deles com um clique metálico, Kael virou-se para encará-la, pronto para perguntar se ela queria água, ou talvez falar algo racional, qualquer coisa para manter o controle...
Mas Victória avançou.
Rápida.
Decidida.
Um beijo veio.
A princípio foi desajeitado. Como se suas bocas estivessem tentando se entender num idioma novo, com ritmos desalinhados.
Um encontro de inexperiência e desejo atropelado.
Os lábios roçaram mais do que se encaixaram, e Victória soltou um risinho nervoso contra a boca dele. "Desculpa..."
"Eu que devia pedir," Kael murmurou, a voz grave, um pouco rouca.
Mas não houve tempo para mais desculpas.
O segundo beijo veio com força.
Dessa vez, Kael tomou as rédeas, e o mundo pareceu girar.
Ele era gentil, mas firme. Seu beijo tinha cadência, pressão, entrega. Era como se ele soubesse exatamente o que estava fazendo. Como se estivesse beijando não só a boca dela, mas a alma — tirando dela todo o peso que carregava.
Victória gemeu baixinho contra os lábios dele, frustrada por perder a liderança no beijo. Seu orgulho ferido ardia mas não tanto quanto o corpo todo, que agora parecia reagir ao toque de Kael como se tivesse sido programado para aquilo.
As mãos dela subiram para os ombros dele, depois desceram pelo peitoral firme por cima do terno.
Ela não pensou.
Apenas agiu.
Começou a soltar os botões do paletó de Kael, e o empurrou levemente em direção ao sofá gigantesco da sala da suíte.
Kael deixou.
Mas ao mesmo tempo...
Suas mãos agarraram a cintura de Victória com força.
Não rude.
Mas firme.
Como se naquele instante, o pensamento de outro homem sequer tocando nela fosse o suficiente para incendiar seu sangue polar.
E isso... fez Kael querer marcá-la.
Não com promessas.
Mas com presença.
"Você ainda tem um noivo..." ele sussurrou entre beijos, mas a voz traía o que queria. Ele não estava tentando frear. Estava só... lembrando a si mesmo.
"Ele é um idiota," Victória respondeu, sem parar de tirar o terno dele, jogando a peça no chão com uma destreza impressionante para alguém embriagada.
Kael riu baixo, o rosto colado ao pescoço dela. "Isso é verdade."
Victória estava deitada no sofá com Kael meio por cima dela agora, os dois ainda vestidos demais para o estado da atmosfera entre eles.
Os olhos dele brilharam em verde-esmeralda sob a luz suave do abajur.
Ela mordeu o lábio inferior, olhando para ele com um desafio infantil. "Vai continuar com essa pose de príncipe de gelo... ou vai me mostrar que homem de verdade não é feito de protocolo?"
A pergunta queimou no ar.
Kael não respondeu.
Ele apenas se inclinou... e voltou a beijá-la.
Dessa vez, sem freios.
Sem desculpas.
Sem medo.
Só eles.
O beijo entre os dois se aprofundando, não era mais um encontro de lábios, mas uma tempestade controlada.
Kael a segurava como se carregasse algo precioso…com um movimento ágil e fluido, ele se levantou com Victória nos braços, os corpos ainda colados como imãs com polaridades insanas.
Ela enroscou as pernas em volta da cintura dele, sem nenhuma intenção de soltá-lo.
O toque da pele dela contra a camisa já meio aberta de Kael fazia cada passo em direção à cama parecer parte de um ritual antigo, daqueles que não precisam de palavras.
No percurso, risadas abafadas e beijos intensos desesperados, descompassados, apaixonadamente bêbados de desejo e champanhe.
A última coisa que Victória conseguiu lembrar foi a sensação de suas roupas escorregando pelo corpo ,seda, renda, algo sendo rasgado e então, preto.
O mundo se apagou em calor.
—Dia seguinte—
O dia seguinte chegou como uma vingança.
A luz da manhã entrava pela cortina mal fechada, gentil para os inocentes, cruel para quem tinha dançado com os deuses à noite.
Victória abriu os olhos devagar, a cabeça latejando.
'Uma ressaca de gala' pensou com ironia.
Mas foi só tentar se mexer... que o verdadeiro inferno começou.
"Ai…" ela sussurrou, tentando levantar.
Cada músculo doía como se tivesse feito três maratonas seguidas... e no final, tivesse sido atropelada por um caminhão do exército polar.
Mas aí vieram as memórias.
Uma.
A uma.
O beijo.
O sofá.
As mãos.
A cama.
As roupas.
As palavras roucas no escuro.
O calor.
Kael.
O nome explodiu na cabeça dela mais forte que a ressaca.
Ela ficou estática por um momento, cobrindo o rosto com as mãos, os olhos arregalados.
"Eu... fiz mesmo isso..." murmurou, envergonhada.
Mas também... feliz.
Muito feliz.
Como se aquela dor no corpo fosse o lembrete físico de que pela primeira vez, ela havia feito algo só por si mesma.
Ao espiar o chão, viu seu vestido,ou o que sobrou dele, espalhado em pedaços discretos. A bainha estava rasgada, um dos brocados arrancado. Ela suspirou, mas sorriu com um brilho debochado nos lábios.
"Selvagem."
Antes que pudesse pensar mais, a porta do quarto se abriu com um rangido suave.
Kael entrou, impecável, usando apenas uma calça social escura e uma camisa branca meio dobrada nas mangas. Os cabelos estavam bagunçados do jeito mais charmoso possível.
Empurrava um carrinho de café da manhã com uma bandeja de frutas frescas, sucos, ovos e... claro, café.
"Bom dia, minha bela adormecida," disse ele com um sorriso torto.
Victória, que continuava deitada e nua, ergueu o dedo indicador num gesto preguiçoso. "Vou precisar de... três cafés. E uma coluna nova."
Kael riu. "Não foi tão ruim assim, vai…"
"Você quase me desmontou, príncipe polar."
Ela tentou se levantar e praguejou baixinho, depois lançou um olhar de canto para ele. "Posso tomar banho?"
"Claro."
Sem cerimônia, e sem um pingo de vergonha, Victória se levantou nua da cama, jogando o lençol de lado.
Kael travou.
O olhar dele correu pelo corpo dela como se fosse a primeira vez que via.
Mas ele não disse nada, apenas suspirou, exasperado, como quem tenta manter a compostura num campo minado de tentações.
Ela sumiu pelo banheiro com um sorrisinho vitorioso.
Minutos depois, saiu usando a camisa dele, que ficava enorme nela, cobrindo até a metade das coxas. Cabelos molhados, bochechas coradas, e aquele perfume que misturava sabonete caro com... Kael.
"Você ficou bonito sem terno," ela disse casualmente, sentando à mesa.
"Você ficou perigosa com a minha camisa."
Tomaram o café juntos, conversando entre um gole e outro sobre bobagens e amenidades.
Mas havia algo no ar.
Um silêncio no meio das palavras.
Uma ponte invisível entre dois mundos.
Foi então que Victória largou a xícara.
"Kael..." ela disse, encarando-o.
Ele parou de mastigar o croissant, os olhos fixos nela.
"Se você me prometer..." a voz dela ficou mais baixa, mais firme, com o tipo de coragem que só vem depois de uma noite como a que tiveram. "Se você me prometer que vai se casar comigo um dia... eu dissolvo o contrato com o idiota. Mesmo que isso signifique ir contra minha família inteira."
O silêncio se estendeu.
Kael a encarou por alguns segundos que pareceram horas.
Então, sorriu.
Um sorriso calmo, seguro.
De príncipe.
Mas também de homem.
Um sorriso que dizia: "eu estava esperando você me dizer isso."
"Com uma condição," ele disse.
Victória arregalou os olhos. "O quê?"
"Você me chama de noivo... a partir de agora."
Ela abriu um sorriso tão grande que os olhos marejaram. "Fechado, noivo."
Kael esticou a mão por cima da mesa, entrelaçando os dedos nos dela.
Momentos deppis, enrolada na camisa larga de Kael e com um sorriso bobo nos lábios pela troca de promessas feita minutos antes, Victória pegou seu iPhone da mesa lateral, pronta para responder às mensagens das meninas no grupo.
Mas assim que desbloqueou a tela…
O inferno notificacional começou.
"Dez... vinte... trinta mensagens?" ela murmurou, franzindo a testa.
Havia dezenas no grupo com as garotas, provavelmente comentários sobre a gala, o vestido, o príncipe gelado e o flertes no salão, mas no meio de tudo, algumas mensagens privadas em negrito de um contato indesejado chamaram sua atenção: "Pai".
Ela respirou fundo, já sabendo o que viria.
Clique.
@Pai: Victória, o que foi aquilo ontem na gala?
@Pai: Você não apenas ignorou Liam, como ainda dançou com um homem que nem sabemos quem é.
@Pai: Você envergonhou a Família Lancaster!
@Pai: Espero que tenha uma explicação antes que essa situação vire uma vergonha pública.
@Pai: Liam me enviou gravações. Inacreditável.
Victória revirou os olhos e soltou um "tch" irritado. "Sabia! Aquele idiota deve ter mandado tudo pro velho..."
Bufando, ela jogou o celular de leve sobre o colo, cruzando os braços.
Kael, que estava terminando de tomar um gole de café e espalhar geleia num pedaço de pão, observou a movimentação com um sorrisinho no canto da boca.
Sem dizer nada, ele se levantou da cadeira e caminhou até onde ela estava sentada no sofá da suíte, com o celular ainda piscando notificações.
Sem cerimônia, ou talvez com toda a intimidade de um noivo recém-promovido, Kael a puxou com delicadeza para o colo, envolvendo-a num abraço caloroso.
Victória deixou escapar um suspiro cansado, mas se aconchegou naturalmente contra o peito dele.
Kael olhou de relance para o celular que ela segurava e, ao ver os textos do pai dela, riu abertamente, com aquele tom provocador de quem vê o drama de longe e sabe que é só besteira.
Victória levantou uma sobrancelha com desconfiança. "Tá rindo de quê, Kael?"
Ele passou a mão nos cabelos dela com gentileza, apoiando o queixo sobre o topo da cabeça dela e respondeu com leve deboche. "Liam parece uma criança mimada que corre pra contar pros pais quando o coleguinha pega o brinquedo que ele queria."
Victória bufou rindo, mas o humor azedou rápido. "Ele não me vê como pessoa, Kael. Só como uma ponte. Um degrau pros Albrights subirem."
Kael ficou em silêncio por alguns segundos, pensativo.
Então segurou o queixo de Victória, fazendo-a encará-lo. "Você não é propriedade de ninguém. E definitivamente não é um degrau."
"Tenta explicar isso pro meu pai," ela rebateu, tentando soar sarcástica, mas a amargura escapou na voz.
Kael franziu o cenho. "Eu posso tentar."
O tom era meio brincalhão, mas por trás dele havia a frieza de um príncipe capaz de congelar oceanos se necessário.
Victória riu. "Você vai marchar até a mansão Lancaster com seu manto de gelo e me pedir em casamento de espada em punho, é isso?"
Kael levantou uma sobrancelha, fingindo pensar. "Se for necessário, eu vou de dragão polar."
"Eles existem?" ela perguntou, rindo.
"A gente descobre juntos."
Os dois se olharam por um segundo, depois riram como adolescentes conspirando contra o mundo.
Victória voltou a encarar o celular, onde as mensagens do grupo continuavam a explodir:
@ Nikoly: ALGUÉM ME EXPLICA O CLIMA NO SALÃO DA GALA... AGORA.
@CheiroDeTerraPósChuva: Kael flertando a princesa Victória. Pronto, já vi tudo.
@Lumine: Ok, ele é bonito. Mas EU NÃO ESPERAVA VICTÓRIA FLERTAR JUNTO.
@ Nikoly: ...e o noivo dela olhando de canto com cara de funeral kkkkkkkk
Victória riu alto agora, quase derrubando o celular no chão.
Kael espiou as mensagens e comentou. "Elas gostam de mim, hein?"
"Não se ache, príncipe. Elas só tão chocadas porque... bom, eu sempre odiei o Liam. E nunca se aproximentei de ninguém em público antes."
Kael arqueou a sobrancelha."Nunca?"
"Nunca."
Ele sorriu de canto. "Me sinto honrado então. Mas... talvez seja melhor você bloquear Liam antes que ele mande um caminhão de vídeos para a mídia também."
Victória rolou os olhos. "Duvido que ele tenha coragem. Meu pai talvez, mas Liam é só barulho."
Kael levantou os ombros num gesto despreocupado e a abraçou mais apertado. "Se ele vier com mais barulho, eu trago neve."
Ela sorriu e se aconchegou novamente, murmurando. "Tô começando a gostar da ideia de me casar com um iceberg."
Kael beijou sua testa. "Não um iceberg. Um vulcão... coberto de gelo."
Eles riram juntos.